Como usá-los para compor seus personagens e worldbuilding?
Olá, vocês, Perpétuos! Sabia que você pode utilizar os arquétipos do Tarot para enriquecer seu worldbuilding, personagens e narrativa?
O Tarot é um jogo de baralho composto por 78 cartas, sendo 22 correspondentes aos Arcanos Maiores, que são figuras com nomes, e 56 correspondentes aos Arcanos Menores, que são as cartas com naipes. O jogo de Tarot representa um caminho evolutivo para o homem através dos símbolos. Para compreender como seria essa trajetória é preciso assimilar alguns conceitos e a simbologia das cartas. Jung foi um psicanalista que estudou o inconsciente coletivo. Um dos conceitos utilizados por ele foi o uso de arquétipos para o autoconhecimento humano. Apesar de ser terreno nebuloso onde algumas pessoas olham com preconceito, estudar e utilizar arquétipos pode trazer exatamente aquele diferencial que você procurava em suas histórias. Escolhemos algumas cartas do Tarot de Marselha para exemplificar o assunto.
O Louco
Jack Sparrow veste a figura do arquétipo do Louco. Seus traços são e únicos, raramente esquecidos pelo público. Além da inteligência e sagacidade do personagem para explorar o arquétipo, criou-se um personagem com a inteligência marcada junto da bizarrice, e com uma pitada de irresponsabilidade.
Já no worldbuilding você pode criar povos ou cidades que tenham como características predominantes, a graça e a loucura. Um exemplo do que podemos citar dentro do worldbuilding para se inspirar é a capital do Japão, Tokyo.
A Papisa
A papisa fala de uma figura feminina, onde seu desenvolvimento é interno. Conhecemos seus medos, seu principal objetivo e suas características para se tornar alguém poderosa, além de seu forte apelo para se tornar mãe. Acompanhamos sua evolução física e sua visão do mundo ser moldada a partir de seus objetivos.
O arquétipo da sacerdotisa fala da evolução da figura feminina através de uma narrativa de sua visão do mundo. Você pode se basear nesse arquétipo para a construção de seu personagem feminina ficar mais verossímil e interessante.
Como exemplo, temos Yennefer de Vengerberg. No seriado acompanhamos sua trajetória desde o descobrimento de sua magia, até se tornar uma feiticeira poderosa.
A Roda da Fortuna
A roda da fortuna é uma carta relacionada a términos de ciclos e inícios inesperados. Quer dizer, não exatamente. Para iniciar uma nova fase é preciso finalizar a anterior, mas existe uma continuidade, uma colheita trazida pelos feitos anteriores. O Arcano tende a nos avisar que os ciclos se repetem e farão isso, sem interrupção, até que a lição seja aprendida.
Um bom exemplo desse arquétipo está no livro "O Diário de Bridget Jones", de Helen Fielding. O livro gerou o filme e ambos tiveram um sucesso estrondoso. Bridget vive uma vida solitária e triste, por suas preocupações com seu peso e sua vida amorosa. Entretanto, a personagem é muito dedicada a seu trabalho e possui uma forma positiva de ver a vida. Ao longo do filme, acompanhamos ela iniciando uma nova fase, onde suas qualidades são percebidas e sua companhia é disputada.
Esse recurso pode ser visto em comédias românticas e dramas. Nas comédias românticas, normalmente, acompanhamos o início dos ciclos e nos dramas o fim, seguido de um início com superação.
A Força
A carta “A força” mostra um arquétipo heroico. A carta não está somente relacionada com a força física, muito pelo contrário. Ela tem uma ligação mais forte com a coragem, inteligência emocional, superação, ímpeto, ação… Em resumo, todos os elementos que levam um indivíduo a se tornar um herói estão representados nesta carta, que geralmente vem retratada por uma jovem acariciando sua fera.
Eu poderia escolher o arco de diversos personagens, mas escolhi o Jon Snow, pois ele já nasceu sendo colocado à prova. Como filho bastardo, foi criado de forma diferente de seus irmãos, recebeu o desprezo e a indiferença de sua madrasta desde cedo. E quando o lorde Stark partiu para Porto Real, foi obrigado a se juntar à Patrulha da Noite. Lá, foi igualmente desprezado. Sua trajetória inteira é repleta de provas a serem superadas, mas ele triunfa sobre todas elas. Triunfa inclusive sobre a morte. Seu papel de liderança, quase imposto, se mostra em determinados momentos. É por isso que ele é munido pelo poder dessa carta.
O Diabo
O Diabo em sua trajetória traz um caos nítido ao longo da narrativa. Personagens como Ramsay Bolton, são odiados pelo público e se você quer fazer um vilão deste tipo, faça seus motivos serem plausíveis com a construção da história. Dê motivos concretos e não apenas um maniqueísmo de suas decisões. Ramsay se adapta ao arquétipo do diabo, onde temos uma visão de um personagem perturbado, movido por seu próprio egoísmo e que não mede esforços para alcançá-los.
A Torre
A torre é uma carta dramática. Quando ela cai nas mãos de uma leitura, indica que uma queda brusca pode acontecer com a pessoa em questão. Esse arquétipo é um bom recurso para gerar dramas, plow twists e obstáculos inesperados na vida do personagem.
Na obra “Kaito: reze para uma boa morte”, de Bruno Crispim, o protagonista é levado a uma viagem repentina para o Japão e acaba vendo o mundo acabar diante de seus olhos. Ele é retirado da rotina confortável que estava criando com sua prima e obrigado a lutar contra os “Azuis”, humanos renascidos e poderosos. Esse é um bom exemplo de como a trama pode se modificar completamente, mas não é a única forma de se fazer isso.
Um jovem que decide se tornar adulto e trilhar a própria rota, sozinho, também faz isso. Utilizar essa mudança brusca pode ser arriscado para a história, porque tirar personagens de sua zona de conforto também é difícil. Corre-se o risco de ficar uma narrativa incoerente. Porém, pode gerar uma história incrível!
A Lua
O contexto de "Mistborn" se encaixa no arquétipo da Lua, pois na composição da cidade foram usadas características sombrias e ocultas, além da ilusão causada pela própria bruma que cerca a cidade. O local é tido como uma cidade misteriosa com suas construções rústicas e lúgubres, principalmente pelas cinzas que caem do céu deixando tudo oculto e umbroso. Assim como em "Mistborn", você pode criar uma cidade que tenha tais características do arquétipo, explorar a fundo e trazer nuances para arquitetura, bem como para a magia que a cerca, pois os nascidos das brumas falam exatamente da cidade e da geografia local.
Assim como em Mistborn, você pode criar uma cidade que tenha tais características, explorar a fundo e trazer nuances para arquitetura, bem como para a magia que a cerca.
O Julgamento
O julgamento, ao contrário de seu nome, não tem a ver com um julgamento direto, mas sobre um julgamento orgânico. Estamos falando sobre colher o que se planta. Isso, pela visão do tarô, é uma oportunidade incrível de se renovar, tendo, porém, as consequências das ações ocorridas no passado. Por envolver acontecimentos que fogem ao controle da pessoa ou personagem, é um momento de tensão e angústia. Os problemas são iminentes e é preciso uma organização clara para transformar o contexto em questão. O arquétipo fala sobre colher o que se planta.
Podemos notar essa situação em obras como "O Conde de Monte Cristo", de Alexandre Dumas, quando acompanhamos a jornada de Edmond Dantès, que em busca de sua vingança pessoal, pune todos aqueles que outrora lhe fizeram algum mal. Ou em “13 Reasons Why”, de Jay Asher, que virou uma série televisiva, adaptada por Brian Yorkey. Na obra, o estudante Clay narra os acontecimentos que envolvem o suicício de Hannah, uma colega de classe. Ao mesmo tempo em que a tensão está presente ao longo da trama, surgem oportunidades constantes de redenção ou de mudança de atitude por parte dos envolvidos.
Utilizar esse recurso contextual é uma oportunidade de gerar tensão através de coisas que aconteceram anteriormente à história contada. Essa mesma questão pode ser percebida na obra "Medeia", de Eurípedes e em "O Inimigo do povo", de Henrik Ibsen.
Seja criativo ao usar os arquétipos para trazer uma visão única de seu mundo e de seus personagens.
Revisão por Elisa Fonseca
Edição por Filipo Brazilliano
Ilustração por Fabiana Souza
Texto por Elisa Fonseca e Nathália Abreu
Adorei a matéria, sou fã do tarot, tenho alguns, já usei pra escrever histórias.