"Muita coisa mudou depois do apocalipse. O Criador nos abandonou e levou os merecedores com ele, para o Céu – mas foram tão poucos que isso é irrelevante. Além disso, nossas tecnologias mais avançadas pararam de funcionar. Doenças e envelhecimento desapareceram. E a nossa pele ficou azul. Por fim, quem continuou na Terra ganhou o presente da imortalidade."
O livro Kaito: reze para uma boa morte, escrito pelo autor Bruno Crispim (@brcrispim) é uma ficção juvenil composta por onze capítulos de um fluxo intenso e dinâmico, onde acompanhamos as aventuras de Kaito ao longo de um mundo despedaçado. Já no prólogo o autor provoca no leitor uma identificação sobre como as coisas eram antes de deixarem de existir.
A história gira em torno de um jovem brasileiro de origens nipônicas e sul africanas. Ao invadir o sistema de sua faculdade numa tentativa de chamar a atenção de seu amor platônico, Clara, acaba boicotando o próprio futuro e é enviado ao Japão para morar com a sua avó, onde reencontra Ayka, uma prima querida. Algumas semanas depois o protagonista se depara com a grande catástrofe: Cento e dez bilhões de pessoas voltam à vida com sede de sangue humano.
Os "azuis" mudam a configuração do mundo e Kaito se envolve em uma eletrizante epopeia. A morte e os renascimentos passam a ser utilizados como uma ferramenta de desenvolvimento pessoal, já que aumentam os poderes com a coleta de almas. É um território farto de motivos para se deixar levar pela irracionalidade animalesca. Entretanto, nosso protagonista resiste à tentação e tenta seguir uma trajetória digna. Salvar a sua amada é o seu maior objetivo, pelo menos até perceber que as coisas em seu âmbito pessoal não são como parecem.
Uma criatura misteriosa de alcunha Vendedora lhe fornece uma escolha difícil. E acompanhar esse instigante desfecho vai fazer com que qualquer leitor de ficção científica se entretenha de forma contagiante.
O livro fornece uma série de características curiosas. A que mais me chamou a atenção foi como a escrita fluida do autor nos leva a imergir no livro, assim como um gamer se envolve em uma partida. A própria estruturação do texto parece com um jogo de RPG. Os locais descritos apresentam riqueza de detalhes, sem atrapalhar a dinâmica da leitura.
Bruno Crispim foi bastante eficaz em trazer elementos da cultura POP japonesa para sua história. Até pela criatura protagonista da trama, os Ghouls, uma espécie de vampiro lendário japonês. Além de criaturas místicas de uma forma geral, como grifos, hidras, dragões, minotauros e górgonas.
Recomendo o livro para qualquer leitor que aprecie uma boa imersão fantástica, mesmo seu público alvo sendo os jovens adultos.
Conheça Bruno Crispim
Bruno Crispim nasceu em Niterói-RJ. Apaixonado por ficção, comportamento humano e finanças, transitou, por muito tempo, nessas áreas. Escreveu alguns romances, participou de coletâneas, inclusive da "Realidades Alternativas", promovida pela revista Superinteressante. Ganhou, também, destaque no Wattpad com GUIA do Escritor de Ficção.
Bruno, como se lançou no mercado literário?
Eu queria desde o inicio uma carreira profissional. Eu era do mercado financeiro, tinha uma carreira estável, estava em um momento estável. Não aguentava mais essa situação estável e fiquei um ano escrevendo. Começou com um conto, depois passou a ser roteiro e pensei: Não, vai ser um romance.
Reparei que se eu atacasse algumas brechas do mercado eu seria publicado. Comecei a conversar com algumas pessoas, depois eu fui à Bienal, comecei a fazer um networking. Pesquisei quais eram os prêmios que existiam no blog Concursos Literários. É um desgaste muito grande mandar livros para editoras porque é uma perda de tempo. Eles não leem seu livro. Uma editora levou quatro anos pra mandar uma mensagem avisando que não conseguiram ler. Nessa procura, achei o concurso e consegui ser publicado por lá.
Depois a editora da Super Interessante falou comigo que estavam precisando de um conto em cima da hora. Através dessa oportunidade, eu fui publicado na revista e depois participei de antologias.
Prefere escrever livros educativos ou livros de ficção?
Prefiro escrever ficção. O texto de não ficção são livros de escrita criativa e emocionalmente eles não me impactam. Como os meus narradores costumam ser em primeira pessoa, eu preciso me envolver realmente. Nesse último livro me diverti muito no processo. Me orgulho de ter me permitido escrever. Kaito foi o que eu gostei mais de escrever.
A sua literatura é caracterizada como literatura comercial. Como você chegou a esse estilo textual?
Eu procuro as necessidades do texto. O leitor tem de ter uma imersão muito grande. Às vezes o meu texto é rápido demais. Quero criar a necessidade de ler as minhas histórias e não pensar em outra coisa. Se eu quero que meu livro seja lido, se quero competir a atenção, preciso competir com a netflix. Só que a Netflix tem um monte de recursos, então, escuto a minha história pra sentir as necessidades dela.
Reparei que você tem pós graduação em marketing e e-commerce. Que dica de marketing daria para os escritores independentes? Você se direciona para algum público alvo específico?
O marketing em si não deve vir como técnica. O primeiro erro do escritor iniciante é ele querer um macete. Ele quer divulgar e empurrar o livro. E quando você faz isso você não será lido. Eu, como tenho vários gêneros, nunca entendi qual era o meu público alvo. Não quero oferecer meu livro pra todo mundo e não quero vender para todos os leitores do Brasil. Mais do que gênero, mais do que idade, eu acho fundamental entender o que os seus leitores leem de verdade. Se você está tentando vender um livro que se parece com Percy Jackson, mas você não gosta de Percy Jackson, você não vai conseguir vender para esse público. Nós não queremos números, queremos que as pessoas conversem conosco. Isso aí você vai conseguir conversando com escritores, com pessoas que têm semelhanças com você. A persona é você, Se você for um senhor de setenta anos que nunca teve um relacionamento, e quer escrever para mulheres sobre relacionamento, não vai dar certo.
Pelo seus relatos as viagens são muito importantes para você. Como você vê a relação entre a literatura e as suas viagens?
Em um mundo perfeito todos os escritores viajariam muito. Porque quanto mais longe você viaja, mais amplia a sua visão de mundo. Para escrever é preciso ter profundidade. As pessoas quando vão a Nova York, passam pouco tempo e não conseguem ter uma noção hierárquica. As viagens permitem, principalmente as longas, permitem essa profundidade.
E como foi a viagem que gerou Kaito?
Eu tive uma oportunidade de ouro, porque conheci a Coreia do Sul. É um misto entre China e Japão muito claro. Chegando lá vi aquele monte de gente que não te empurra e te respeita. Nós passávamos por uma região mais pobre no trajeto, direcionada a pessoas idosas. Daí eu pensei: Como seria se tivesse ainda mais gente? Essa ideia começou a crescer.
A viagem a princípio teve o planejamento de quatro meses, depois se estendeu por um ano. Passei dois meses no Japão. Ele foi escrito em três cidades com a população muito concentrada.
Pode nos contar um pouco da história do livro nas suas palavras?
É a história de uma pessoa que estava no Japão no momento do apocalipse. As pessoas ficariam na terra, presos. Somente os justos seriam levados aos céus. Isso faz com que a grande maioria fique presa. Coloquei alguns elementos como dois prédios cheios de fliperama da Sega, porque é uma sociedade que se pauta em jogos. Um apocalipse gamificado.
O mundo foi abandonado e quem está governando são os demônios. Quem volta à vida tem a pele azulada e sente muita fome. Eles não são zumbis, mas a única coisa que mata a fome deles é a carne humana. Então, os personagens vão ficando mais fortes e ganhando habilidades. Competindo entre si. Entretanto, eu vejo também como um grito de amor no centro do mundo. É um livro de amor, muito romântico e também pesado.
Onde normalmente você busca inspiração e referência? Pode nos contar quais foram as utilizadas na construção de Kaito?
Busco referências em vários lugares. Sou muito eclético, gosto de todos os gêneros de música, cada um para um momento. Leio Webtoons independentes, autores de outros países, literatura considerada ruim e literatura densa. Lavoura Arcaica é bastante lírico, mas conseguiu me puxar muito para a história. Vejo muito isso em literatura fantástica, como em "Conde de Monte Cristo". Toda essa literatura que foi publicada em jornal também.
Eu bebo muito da fonte de mangá, bebo muito da fonte oriental. Para Kaito pensei em vários clássicos da cultura japonesa como Gantz, Tokyo Ghoul, Percy Jackson, Battle Royale e One Punch-man, onde o protagonista é exatamente o contrário do modelo tradicional de herói
Como você cria os seus personagens? E a criação do protagonista de Kaito?
O conflito do protagonista é que gera a história e os outros personagens. Como uma onda que afeta tudo a sua volta. Algumas vezes percebo a necessidade de uma pessoa ao lado do protagonista. De início, todas as personagens são superficiais, e na reescrita que elas ganham profundidade. Escrevi em primeira pessoa todos os livros.
Para a criação de Kaito fiz o planejamento e alguns testes de voz. Consegui entender melhor a história e saí de lá com a as cenas e a voz do personagem muito bem definidas. Nesse momento, aproveitei para manter a minha sanidade escrevendo essa história. Escrevi setenta mil palavras em abril e depois ele passou para leitura crítica e uma primeira revisão profissional. Aliás, uma dica, se o seu narrador não for muito interessante, não coloque ele em primeira pessoa.
Ele é seu personagem favorito?
Eu sempre adoro os meus personagens, mas tem uma personagem nesse livro que me conquistou. Ela é a prima do protagonista, uma mulher bem forte, que vai conseguindo um papel de liderança.
Onde normalmente você busca inspiração e referência? Pode nos contar quais foram as utilizadas na construção de Kaito?
Busco referências em vários lugares. Sou muito eclético, gosto de todos os gêneros de música, cada um para um momento. Leio Webtoons independentes, autores de outros países, literatura considerada ruim e literatura densa. Lavoura Arcaica é bastante lírico, mas conseguiu me puxar muito para a história. Vejo muito isso em literatura fantástica, como em "Conde de Monte Cristo". Toda essa literatura que foi publicada em jornal também.
Eu bebo muito da fonte de mangá, bebo muito da fonte oriental. Para Kaito pensei em vários clássicos da cultura japonesa como Gantz, Tokyo Ghoul, Battle Royale e One Punch-man, onde o protagonista é exatamente o contrário do modelo tradicional de herói
Além das obras citadas, Bruno é autor de "O Segundo Caçador" e "Morte e Ascenção de Darla Abranches". Para saber mais, clique aqui.
Resenha, edição e revisão por Elisa Fonseca
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